terça-feira, 5 de março de 2013

The Macanese way

Esfregas os olhos pela terceira vez, espreguiças-te pela quinta e levantas-te finalmente.
Entre banhos, bocados de torrada e escovas de dentes, vestes à pressa uma camisa e o fato, e vês um yuppie no espelho do elevador que reflecte a tua imagem.

Sais de casa e pensas: "nada mau, já esteve mais calor!". A humidade é chata e piora com o calor.
A humidade faz com que respirar se torne parecido com tentar beber um batido com uma palhinha...
O dia está estranhamente limpo e belo. O céu azul está efectivamente azul, o que nem sempre acontece; mas a água, essa, nem é azul, nem está azul, nem parece azul: é castanha e faz-te ter a impressão de que se aquela ponte onde o autocarro passa caísse, tu não morrias afogado, mas de ataque cardíaco só de pensar em mergulhar naquele mar com cor de café com leite.

Falando em café, pegas num Nescafé do seven eleven mais perto de ti (para registar: há cerca de duas lojas destas por metro quadrado, em Macau), e ok, podes acordar...
Agora forças a entrada
no autocarro com mais densidade populacional do bairro, e que (se o olhar ainda ensonado não te tiver falhado) é o 33.

Estás no autocarro. Fixas o rosto das pessoas a caminho do trabalho. Sorris e fazes uma cara de alien acabado de chegar a outro planeta. Olhas para as pessoas, sorris, e pensas: alguma vez sentirás que pertences a esta terra???
Não.
E assim, sorridente e com pensamentos de gente crescida com sono, a acusar a falta do "cafézinho" português (essa instituição...) partes rumo a mais um dia de trabalho enquanto tiras mais uma fotografia dentro do autocarro, a qual, em menos de 20 segundos, vai estar no facebook.


Basicamente, todas as manhãs em dias de trabalho são mais ou menos assim, por cá.
Depois, vem o dia de trabalho. Hoje a frase do dia foi: "Deus é fortíssimo ao nível das torradas". Só não me peçam é para explicar isto. Mas precisava de ver isto escrito.

Adiante, depois do dia de trabalho vem o regresso a casa, com Beatles, Strokes ou Led Zeppelin no MP3  (já agora Beatles combinam na perfeição com esta cidade).
Depois, uma corridinha para assinalar o fim do dia de trabalho e tirar ferrugem aos meniscos.
Depois e independentemente do que se siga - mas que deixo para outro dia, para abreviar - começa a contagem regressiva para o próximo dia.
Aos poucos, dia após dia, uma rotina comeca a criar-se. A entrar na minha vida.
Não é uma rotina má, mas vindo de quem não gosta de rotinas seria patético dizer que é boa...
É uma rotina, pronto.
Uma rotina-rotina, assim mesmo... rotineira.
Talvez seja cómoda, como qualquer outra rotina, mas é ainda assim uma rotina!! E isto sem desprimor: é uma rotina, sim senhor, mas diga-se: é uma bela duma rotina!!
Só não sei se continuará a ser uma bela rotina daqui a 3 meses ou daqui a 6 meses. Mas lá chegaremos.
É que, como já disse, ainda estou na fase "Cerelac", em que tudo é deslumbrante, tudo é novo, tudo é mais ou menos espetacular.
Sim. Gosto disto!!!


Tiago

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Please, fasten your seatbelts

Long time, no see. Após 3 semanas em Macau, estou finalmente estabilizado e muito contente por poder finalmente parar e dar alguma atenção ao blog.
Sim, ainda continuo a ir todos os dias para o trabalho com aquele sorrisinho de bebé deslumbrado, de quem está num mundo onde não pertence, como se isto fosse tudo um sonho (mas calma, nem tudo é um sonho... já lá vamos...), irreal, fabuloso. Ainda continuo a espantar-me com o tamanho dos edifícios, com o ritmo frenético dos chineses que não param um minuto (excepto os 15 minutos depois de almoço em que aplicam a testa na mesa e ficam offline por uns momentos).
Os edifícios, pelo menos os principais, são de uma sumptuosidade (às vezes exageradamente exibicionistas, a resultar num "luxo tosco") incrível, embora o gosto nem sempre seja o melhor... O dinheiro parece estar em todo o lado, e só o facto de ao vir para o escritório passar por lojas Gucci, Chanel, Armani, Louis Vuitton, Dior, Prada, ou de entrar em qualquer casino e ele estar cheio já diz tudo.
Em cada rua, há qualquer coisa a ser construída. Geralmente são edifícios enormes... Ou o metro...
Sim, aqui há dinheiro! E com todas as vantagens e desvantagens inerentes - esta é para quem ainda se lembra do vídeo viral "e se o dinheiro não existisse".
Não sei como Macau se transformou no que é hoje, nem sei o que era Macau em tempos idos em que Portugal era Senhor destas duas ilhas+península, que hoje graças às maravilhas da engenharia, é apenas uma ilha+península, e que no total não chega a ter a área da cidade do Porto.
Sei apenas que por trás deste deslumbramento, desta riqueza, tenho dificuldade em descobrir, em cada chinês, verdadeira felicidade. Ou há uma felicidade falsa, superficial, ou então - regra geral - vejo rostos fechados de pessoas que pertencem a uma sociedade que vive focada em trabalhar e (pelo que me parece) não conhecem o significado de "lazer"... Ou eu ainda não me adaptei à fisionomia oriental, ou parece-me que os chineses, em regra, não são felizes. Ou são, mas de uma forma diferente...
Por falar em diferenças, assim de repente, impressiona a forma voraz com que os chineses manobram os pauzinhos enquanto cospem os ossos e tudo o que não é comestível para cima da mesa (provavelmente isto só se aplica a uma minoria da população, mas é verdade que a imagem do chinês a devorar a comida em 2 minutos e a cuspir para cima da mesa marcou-me). Também é estranho ouvir arrotar "like a boss" no meio da rua, ou ver o motorista do autocarro a cuspir no chão, mesmo ao lado dos meus pés.
Mas isto são só diferenças culturais. O estranho aqui somos nós, não eles, porque eles estão em casa. Costuma dizer-se que "a terra onde fores ter, faz como vires fazer" - e eu já aplico isto, por exemplo, a entrar nos autocarros a empurrar e dar cotoveladas em toda a gente...
O choque cultural existiu mesmo, garanto. Mas vamos com calma, porque na verdade: "People are strange, when you're a stranger...", já dizia o Jim Morrisson.
No resto, estou muito bem aqui!!! Posso dizer que estou a adorar!!
Claro que de vez em quando bate uma saudade de casa, das minhas pessoas, da comida, do céu limpo... Há uns dias fui dar uma volta por aí e encontrei um monumento que dizia isto assim, mesmo em português, na porta:
ALTO! SENTIDO!
RECORDA POR UNS INSTANTES
A HISTÓRIA LINDA DA NOSSA
PÁTRIA. ENTRA ALTIVO E DE
CABEÇA ERGUIDA PORQUE ÉS
SOLDADO DESSA PÁTRIA!!
E confesso, aqui, do outro lado do mundo: nunca, em 26 anos, me senti tão português como naquele momento...
E por hoje chega...

domingo, 27 de janeiro de 2013

0 - Um enorme salto no vazio




(Antes de mais, este não é o primeiro post do blog... é apenas uma introdução, o post "0", se quiserem. O blog, esse, só começa efectivamente quando eu puser os pés em Macau - e desculpem a cor de fundo do texto, mas estamos com uns problemas típicos de principiantes que serão brevemente resolvidos).
 

Há uns meses, lembro-me de ter lido uma frase (de Robert Frost, poeta americano) que dizia: "The only certain freedom is in departure".
(Isto das frases feitas bonitinhas e das citações muito pseudo-intelectuais e com algum sentido deixou de ter piada alguma desde que começaram a ser partilhadas massivamente no facebook, com fundos de montanhas e praias da Polinésia Francesa, não foi? Agora de cada vez que uso uma frase que não é minha tenho suores frios e imagino a frase sobre um fundo de palmeiras e um mar cristalino - o juízo de censura é imediato).
Mas enfim: é um facto. Não será uma verdade absoluta, mas é certo que existe um sentimento especial nestes momentos em que partimos (voluntariamente), em que deixamos para trás algo; muitas vezes nestas alturas sentimo-nos mais livres, mais leves, mais "senhores da nossa vida" em vez de meros actores na nossa rotina.    


E aqui estou eu agora, livre, sem dúvida, prestes a deixar para trás uma etapa e uma vida (que amo: os últimos oito anos foram talvez os melhores, até ao momento...) em troca de um futuro indefinido, incerto, mas que de certeza vai ser repleto de bons motivos para me lembrar com alegria do dia em que, há uns meses, prometi a mim mesmo não cair na tentação de procurar ter uma carreira estável em Portugal e decidi sair do escritório onde estava a trabalhar.
E tudo me leva aqui, a este momento... À véspera da partida para Macau. De que deverei falar hoje?
Das minhas expectativas? São enormes, brutais!
Das minhas expectativas realistas? Continuam a ser enormes, brutais!
Se eu acho que as minhas expectativas se vão cumprir? Tenho a certeza que, de alguma forma, sim!
Enfim... Não sei o que dizer. E também não quero "pessoalizar" este espaço, aliás, espero que este seja o post mais pessoal de todos, e em tudo o mais vou procurar ser "apenas um gajo que está em Macau a fazer um estágio de seis meses" - e futuramente, poderei acrescentar mais palavras antes de fechar aspas, mas por enquanto, é apenas isto.

Acho que neste momento, não tenho grande coisa a acrescentar... Daqui a uma semana vou tar no outro lado do mundo portanto neste momento não me faltam coisas para fazer e assuntos para entreter o pensamento. Macau...



Também não faço ideia do que vai sair deste bolgue. A ideia no momento é que seja uma coisa impessoal, uma espécie de prólogo para o livro ou blogue de viagens que um dia, espero eu, virei a escrever. Mas sei que por vezes vai ser difícil manter essa objectividade, essa impessoalidade, por isso, bem, o blogue será o que fizermos dele, não só eu mas também e especialmente quem estiver desse lado...

Se for importante para quem precisar de saber um bocadinho mais, chamo-me Tiago, tenho 26 anos  e sou recém-advogado (ou pelo menos, uma parte de mim é). Sou um sagitariano convicto, um sportinguista não crente, um filho único (mas a gata é como se fosse irmã...) e segundo dizem as estatísticas, um INFP (ou ISFP, nunca soube) sociável e socializado... Aparte disso e no que realmente importa: vou para Macau realizar um estágio no âmbito do programa de estágios internacionais Inov Contacto ao qual me candidatei em Junho de 2012 - daí o nome do blogue..
Foi mais ou menos nessa altura que tomei uma decisão radical. Cansado de uma certa rotina entorpecedora na qual não me imaginava a seguir o resto da vida, e de um país em crise em que todos ralham e ninguém tem razão, deixei o sítio onde estava a trabalhar e decidi que ia passar 2013 por aí, com uma mochila às costas - a começar na Nova Zelândia. Depois de me terem tentado internar em instituições psiquiátricas por causa desta minha decisão (estou a brincar) regressei à minha terra natal para planear algo parecido com um "gap year" para 2013 - e basicamente, para poupar uns trocos para o projecto. Mas como a vida, nas palavras do John Lennon, "é o que acontece enquanto estamos ocupados a fazer outros planos", aconteceu mesmo vida e enquanto eu me ocupava com a planificação desta odisseia, surgiu uma chance diferente... E quando eu pensava que a rotina de secretária e fato e gravata não iria nunca regressar à minha vida antes de 2014, surgiu-me esta oportunidade única de ir para Macau. Eu sou contra adiarmos os nossos sonhos, mas também sou contra ser estúpido, em geral, e por isso, como é óbvio, tive de rever os meus planos para 2013 face a estas circunstâncias: é uma oportunidade única do ponto de vista pessoal e profissional, e obviamente, boa demais para desperdiçar!!! E por isso, aqui vou eu, cheio de vontade e motivação para encarar esta nova etapa.

 

Basicamente, tudo o que eu queria e necessitava era de sair de Portugal e, preferencialmente, da Europa!!! Se tivesse que ser com uma mochila às costas e guiando-me só com um plano abstracto, seria assim e aliás esteve quase para ser assim... Mas claro, se puder ser desta forma, através do Inov Contacto, será muito melhor.

Vou para uma área do mundo que desconheço, rodeado de países que sempre sonhei conhecer. Espero que estes seis meses me permitam conhecer muita coisa e verdadeiramente "viver" Macau e a China. De resto, o foco deste blog são, por um lado, as experiências do dia-a-dia de um portuga em Macau, e também as viagens que quero fazer por lá.

Por hoje, despeço-me com amizade, como o senhor da Compal. O blogue segue dentro de momentos, espero que gostem, leiam, comentem e partilhem! A gerência agradece.

Tiago